segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Bordeaux - O melhor vinho do mundo - Parte III.



A classificação de 1855

Prepare-se, pois cada região de Bordeaux tem a sua própria classificação. Apesar de alguma semelhança entre elas, detalhes podem fazer uma grande diferença. A classificação mais antiga e conhecida é a do Médoc, à margem esquerda do Gironde. Ela foi encomendada por Napoleão III em 1855. A ideia era graduar os melhores châteaux e vinhedos da região. A classificação foi baseada em qualidade, mas principalmente, no preço e no prestígio dos vinhos. Passados mais de 160 anos a classificação ainda vigora. Vejamos algumas curiosidades:

1 – Os 61 vinhos foram hierarquizados em cinco categorias, todos tintos, de premier cru (os melhores e mais famosos: os ícones de Bordeaux) ao cinquième cru (teoricamente os “piores” da classificação). Neste contexto a palavra “cru” em francês significa “um vinhedo ou um conjunto de vinhedos”.  A palavra premier significa primeiro e a cinquième, quinto. Assim, a classificação de 1855 graduou os vinhos do Médoc em cinco categorias: premier cru, deuxième cru, troisième cru, quatrième cru e cinquème cru.

2 – Na teoria um “segundo cru” é melhor que um “quinto cru”, e assim por diante. Porém, na prática esta afirmativa não é válida. Os motivos são vários: safra do vinho, zelo do produtor e especialmente a evolução do Château no tempo – mais de 160 anos. A classificação foi alterada apenas uma vez, quando em 1973 o Château Mouton Rothschild deixou a segunda categoria e passou a frequentar a do grupo mais nobre.

3 – Todos os vinhos desta classificação expressam em seus rótulos o termo “Cru Classé 1855” ou mais frequentemente “Grand Cru Classé 1855”. A palavra “Grand” (grande) no Médoc tem pouca importância, mas nas outras regiões o termo pode ser relevante. Já “Classé” significa classificado.



4 – Até aqui, escrevi que todos os vinhos são provenientes do Médoc, porém existe uma exceção, o Château Haut-Brion que é de Graves. Portanto, na classificação de 1855, 60 vinhos são do Médoc e apenas 1 de Graves, todos da margem esquerda. Todos sem exceção!

5 – A grande maioria dos vinhos está situada nas quatro sub-regiões do Haut-Médoc: Saint-Estèphe, Pauillac, Saint Julien e Margaux. Contudo, alguns vinhos “Grand Cru Classé 1855” ficam fora destas 4 sub-regiões, mas ainda dentro do Haut-Médoc, e desta forma aparecerá no rótulo da garrafa a origem do vinho:  A. Haut-Médoc C., além do Grand Cru Classé 1855, é claro.



6 – De uma forma geral, em boas safras, estes vinhos são excepcionais. Quase todos com grande poder de envelhecimento e guarda, durando 15, 20, 30 anos ou mais. Usualmente eles estarão prontos para serem bebidos a partir de 10 a 15 anos, na dependência do produtor e da safra. Dica: procure por vinhos com mais de 10 anos. Antes disso, eles são ásperos, duros e fechados.

7 – Veja na tabela a seguir, a lista de todos os 61 vinhos da Classificação de 1855. Ao final desta série – Bordeaux, o melhor vinho do mundo – voltarei a comentar sobre alguns vinhos que já degustei e suas características.



8 – Praticamente todos os châteaux classificados em 1855 produzem o chamado “segundo vinho” da casa. Eles não têm a excelência dos primeiros, mas usualmente tem ótima relação custo-benefício. Dois exemplos: o Château Montrose produz o La Dame de Montrose, seu segundo vinho. Já o Château Gruaud Larose produz o Sarget de Gruaud Larose, um tinto muito bom. Não confunda o deuxième vin, segundo vinho, com deuxième cru.





9 – Para finalizar a classificação do Médoc, gostaria de comentar sobre uma categoria importante de Bordeaux, denominada de “Cru Bourgeois”. Os vinhos não pertencem à classificação de 1855, mas gozam de grande prestígio na região. São cerca de 200 Châteaux. Infelizmente, existe uma grande heterogeneidade na qualidade dos vinhos desta categoria, mas existem excelentes vinhos e de ótima relação custo-benefício. Destaco dois vinhos desta categoria que estão situados na região de Moulis no Médoc (Moulis en Médoc), e que são muito bons: o Château Maucaillou e o Château Chasse-Spleen.



9 – Por último, gostaria de citar que alguns excelentes produtores não classificados em 1855, se recusam a entrar em outras classificações, e mesmo assim produzem vinhos extraordinários, como Jean Gautreau do Château Sociando-Mallet no Haut-Médoc.



Terminamos aqui a classificação do Médoc. Passemos rapidamente pelas outras regiões de Bordeaux.   

Na região de Graves, ao sul da cidade de Bordeaux, a classificação é mais singela. Existem apenas 13 vinhos tintos e 8 vinhos brancos classificados como superiores – os chamados Grand Cru Classé. A Classificação foi feita em 1953 e revista em 1959. Não há uma ordem hierárquica entre os vinhos. Destaco o Château Pape-Clément, um tinto magnífico, além, é claro, do premier cru Château Haut-Brion.



Talvez em Saint-Émilion temos a classificação de Bordeaux mais complexa e a que costuma gerar mais confusão. Os vinhos foram classificados inicialmente em 1954, com a perspectiva de revisão a cada 10 anos, a última em 2012. Veja alguns detalhes desta classificação:

1 – Os grandes vinhos, os Châteaux mais prestigiados e melhores, foram denominados de Premier Grand Cru Classé.  Aqui a palavra Premier faz toda a diferença, fique atento! Nesta primeira subcategoria, quatro vinhos foram ainda denominados do Grupo “A” (Château Ausone, Château Angelus, Château Pavie e Château Cheval Blanc), os melhores da região, e outros 14 vinhos ficaram no Grupo “B”, melhores que os demais não participantes destes grupos, sem letras. Um famoso vinho da subcategoria “B” é o Château Figeac.



2 – A segunda categoria de Saint Émilion é denominada de Grand Cru Classé (sem a palavra Premier). Usualmente são bons vinhos. Existem 63 vinhos classificados nesta categoria. Neste link, http://www.artwine.com.br/noticias/270/as-surpresas-da-nova-classificacao-de-saint-emilion , você encontrará a lista de todos os vinhos Grand Cru Classé da região.

3 – A terceira categoria é a Grand Cru, sem o Premier no início e sem o Classé ao final. Existem dezenas de vinhos nesta categoria o que explica a heterogeneidade da qualidade destes vinhos. Por vezes são caros, magros e pouco inspiradores. Outro são bons e baratos. Fique atento!

Em meio a esta confusão os vinhos de Pomerol jamais foram classificados. Nem mesmo o famoso Château Petrus entrou na classificação de 1855. Nem por isso, deixou de ser o mais caro e famoso vinho de Bordeaux.



MJR

* Em breve a parte IV



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